Exclusivo - A Casa de Papel | O apocalipse segundo Tóquio - Estreia em Portugal

Úrsula Corberó é Tóquio na série A Casa de Papel, personagem central em toda a história. 📷 © DR

Desde o primeiro episódio que é a voz dela que conduz a narrativa de A Casa de Papel. Tóquio, uma das personagens mais fascinantes da série, interpretada por Úrsula Corberó, está prestes a despedir-se dos seus milhões de fãs, já que nesta sexta-feira estreia a quinta e última temporada. O que lhe vai acontecer, a ela e aos outros, é o que descobriremos em breve.

Quando as coisas estão em ruínas, eu reajo. Isto não se aprende, é inato", diz Tóquio ao Professor, no momento em que contesta a liderança de Palermo no cenário apocalíptico do Banco de Espanha. Tudo isto se passa - já o adivinharam na quarta temporada de A Casa de Papel, a série espanhola da Netflix que pulverizou recordes de audiências um pouco por todo o lado e transformou os seus atores em "estrelas" internacionais. Com Úrsula Corberó e Álvaro Morte à cabeça de uma galeria de personagens inesquecíveis, em que nada é simples ou sequer maniqueísta. Quem são os bons e quem são os maus? E, já agora, com quem é que o leitor realmente se identifica?

No final da temporada anterior, como mandam as leis do suspense em ficção, o grupo ficou suspenso no limiar do precipício: depois de 100 horas de pura tensão (e tragédia, com a morte de Nairobi) no interior do Banco de Espanha, é conseguido o resgate de Lisboa mas, no último momento, o Professor é encurralado por Alicia Sierra, a gélida agente dos serviços secretos, que já julgavamos caída em desgraça. O que vai acontecer a seguir? Por que nova montanha russa de emoções nos conduzirá o tom melancólico com que Tóquio nos vai desfiando a narrativa desde o primeiro episódio? E, já agora, perguntam muitos participantes nos vários grupos da internet dedicados à série, porque é Tóquio, e não qualquer outra personagem, a contar a história? Isso significa que, no final, ela será a única sobrevivente? E a quem contará? Ao filho de Nairobi, de quem é madrinha, à polícia, a um juiz...? E a ser verdade este último caso, porque o faz? Por rendição ou por estratégia?

A estas e outras hipóteses, a produção responde apenas que a ação, que já era trepidante, se tornará verdadeiramente "selvagem" nos próximos episódios: percebendo que perdeu o controlo da situação, o coronel Tamayo (que dirige as operações policiais) chama o exército, transformando um grande assalto numa guerra. E o que acontecerá realmente ao Professor e a Alicia? No fim da temporada (dividida em duas partes, uma exibida agora em setembro e a outra no final do ano), que se sabe já ser a última, quem vive e quem morre? Aceitam-se apostas até ao momento do les jeux sont faits, rien ne va plus.

Como se para excitação não bastasse, esta quinta temporada traz ao público português o gosto de ver várias cenas filmadas em Portugal. Já tiveramos um fado de Piedade Fernandes na banda sonora da primeira temporada, uma personagem importante chamada Lisboa, agora veremos mesmo várias cenas filmadas na nossa capital e em Cacilhas, do outro lado do Tejo. Os protagonistas dessas cenas foram Úrsula (aliás, Tóquio) e um novo intérprete acrescentado nesta temporada, Miguel Ángel Silvestre.

O que faziam realmente aqui - alguns aventam que serão o par amoroso da quinta temporada? É um dos enigmas que veremos resolvido dentro de dias.

Assim nasce uma "estrela" 

Ouçamos Tóquio uma vez mais. A sua voz, lenta, quase hipnótica, conduz-nos nesta "tapeçaria" de muitos "fios" desde o inicial "Chamo-me Tóquio, mas quando esta história começou não me chamava assim." Ao fim de 15 assaltos perfeitos, viu o amor da sua vida ser executado pela polícia em plena rua.

"Foi aí que passei de ladra a assassina" porque "de certo modo, já estava morta." Sem nada a perder (a não ser o amor da mãe, que quase lhe será fatal logo no primeiro episódio), é salva in extremis pelo Professor, com a sua modesta viatura, mas muito ambicioso plano. Doravante, Tóquio, toda ela razão e paixão, gelo e fogo, tornar-se-á uma das personagens mais fascinantes da saga.

A mulher exangue e desprotegida do primeiro episódio vai adquirindo força à medida que, ao longo da história, ganha causas por que lutar - um objetivo (o assalto), a admiração pelo Professor, a amizade incondicional por Nairobi, a paixão por Rio. Mas a vulnerabilidade e a consciência de que tudo o que é sólido se dissolve no ar, para citar a constatação de Marx e Engels, nunca a largam verdadeiramente, tornando a personagem ainda mais rica e carnal.

A produção da série garante que a ação, que já era trepidante, se tornará verdadeiramente "selvagem" nos próximos episódios.

Para a produção não foi fácil encontrar a atriz que lhe "emprestasse" o corpo e a voz. Numa fase inicial, pensaram numa atriz mais velha. Mas acabaram por se render a esta catalã, com menos de 30 anos à época dos castings, percebendo que ela ia dar uma energia muito sedutora à personagem. Foi um salto de fé porque, como a própria Úrsula reconhece, a sua carreira até aí limitava-se a papéis de menina bem ("pija", em castelhano), o mais famoso dos quais na série Física ou Química, nos antípodas de Tóquio. Em declarações à Vogue Espanha de setembro (de que a atriz é capa e protagonista de um longo editorial de moda), o produtor da série, Jesus Colmenar, destacou a sua força e carisma: "Quando crava os olhos na câmera pode transpassar-te o peito. E o coração. É um animal selvagem cheio de potência e sensualidade, mas também com uma grande sensibilidade. É como uma pequena cria de javali, sem medo. Antes de A Casa de Papel ninguém poderia imaginar que conseguisse colocar sobre os seus ombros todo o peso épico de uma super-heroína de ação. Mas quando a vi como Tóquio percebi que ia conseguir algo de inesquecível e explosivo."

Para a atriz, o papel foi decisivo, já que não é à toa que se ocupa a primeira página da Vogue, sobretudo no september issue (o número mais importante do ano para os títulos de referência da imprensa de moda). Tornou-se a musa e a imagem do designer de moda francês, Jacquemus, o seu Instagram já duplicou o número de seguidores (mais de 21 milhões e 200 mil até hoje 02/09) de outras espanholas "globais", a cantora Rosalía e a multipremiada atriz Penélope Cruz.

Esta vertigem começou no final de 2017, quando a Netflix se interessou e adquiriu os direitos de exibição de uma série que passara na televisão espanhola sem despertar entusiasmo de maior. "Estrearam-na no dia de Natal", contou Úrsula à revista In Style espanhola. "Eu estava de férias no Uruguai, em casa dos pais de Chino Darín, meu namorado (filho do ator argentino, Ricardo Darín). Ninguém me conhecia ali, mas fomos a uma festa de fim de ano numa discoteca gigante e, de repente, as pessoas vinham ter comigo e diziam: Tóquio, és uma deusa. E eu disse a Chino: Que engraçado! Os quatro gatos pingados que viram A Casa de Papel estavam na festa. No dia seguinte, quando acordei, tinha dobrado o número de seguidores nas redes. Comecei a contactar os colegas de série e estavam todos tão perplexos como eu."

A vida no arame de Tóquio, tão diferente em tudo da de Úrsula e da imagem bem-comportada que os telespectadores espanhóis dela tinham, levou-a a trabalhar a fisicalidade da personagem. Porque Tóquio é aquela que, por mais que seja encostada às cordas, sempre encontra a frincha no sistema.

Uma sedutora letal, como se vê no final da quarta temporada, quando enfrenta Gandía, o chefe de segurança do Banco de Espanha, num duelo tão assassino como sexual. Mas também é a apaixonada, destroçada pela ruptura imposta por Rio, mas que prossegue o seu trabalho porque não se têm desgostos de amor quando se assalta o Banco de Espanha. Essa dureza com ela própria e com os outros foi trabalhada também com a escolha de penteados que lhe endurecessem as feições, tornando-a uma digna parceira de Nairobi, interpretada pela atriz Alba Flores, herdeira dos traços fortes da dinastia do espetáculo mais amada no país vizinho (é sobrinha da atriz e cantora, Rosario, e neta de Lola). "Necessitava acentuar as minhas feições para ser a mais perigosa possível porque queria que o público esquecesse completamente a imagem doce que tinha de mim", disse Úrsula, em entrevista à Vogue Espanha.

Tão convincente foi essa mudança de pele que, após a conclusão das filmagens de A Casa de Papel, a atriz rumou ao Japão para protagonizar a sua primeira produção made in Hollywood, G.I Joe: Snake Eyes (onde dá vida a Baronesa, uma operacional de elite do grupo Cobra), que estreou nos Estados Unidos, em julho passado. Ser Tóquio em Tóquio, onde foi filmada grande parte da ação, maravilhou-a: "Jamais imaginaria que no Japão se visse A Casa de Papel, até pelas diferenças culturais. Mas reconheciam-me e abordavam-me", contou à Vogue Espanha. Mas o que mais a seduziu foram as boas maneiras dos japoneses: "O modo como as pessoas interagem com os atores é muito diferente daquilo a que estava habituada. Ali ás pessoas falam, pedem autógrafos, uma selfie, mas sempre de uma forma muito educada e até púdica."

A vida depois de Tóquio afigura-se promissora para Úrsula, mas a atriz não esconde que lhe foram pesadas e angustiantes as semanas que se seguiram ao final das filmagens. E que o coração se lhe há-de sobressaltar sempre que, no centro de Madrid, encarar a imponente fachada do Banco de Espanha.

Maria João Martins/DN

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