Uma das vantagens dos debates entre os candidatos presidenciais nesta reta final das eleições, possivelmente a maior, é que o ex-presidente Lula se vê enfim obrigado a falar em público de corrupção. Lula foge desse assunto, há anos, como o diabo da cruz. Se dependesse dele, a palavra “corrupção” não existiria nos dicionários da língua portuguesa; com certeza é um tema que ele quer eliminar de toda e qualquer discussão política neste país. Seu sonho, nesta campanha, seria passar o tempo propondo criar o Ministério do Sorriso, fazer um Brasil “feliz” e prometer que os pobres vão viajar de avião – além, é claro, de socar dinheiro público nas estatais, encher outra vez de funcionários a máquina estatal e conduzir a todos nós para o “socialismo”. É como se corrupção fosse um fenômeno que nunca existiu no Brasil, como os terremotos e as tempestades de neve; um negócio que não faz parte das preocupações de ninguém e, portanto, não tem o menor interesse para o público.
Não falar nunca mais em corrupção? É um projeto de realização difícil. Lula não fala, mas os outros falam – e como poderiam não falar, com tudo o que aconteceu no país e que não pode ser apagado da realidade? O TSE, em cumprimento a suas exigências, pode proibir que se toque na questão, mas isso não resolve realmente as coisas para o candidato do PT; quando chega o debate na televisão, nem o ministro Alexandre de Moraes consegue impedir que se fale na roubalheira frenética dos quase catorze anos de governo de Lula e Dilma – o período em que mais se roubou dinheiro público nos 522 anos de história do Brasil. Fazer o que? É impossível mudar o fato básico de que Lula foi condenado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes. É impossível pretender que diretores da Petrobras e empreiteiros de obras públicas não confessaram em juízo os seus crimes e devolveram montanhas de dinheiro roubado. É impossível ignorar que os corruptos delataram publicamente uns aos outros – ou que houve na Justiça uma Operação Lava Jato, e que até ministros do STF, esses mesmos que hoje são os militantes mais excitados da candidatura de Lula, disseram na época que em sua passagem pela presidência o Brasil foi saqueado por uma ”cleptocracia” e governado por uma “organização criminosa”.
Não podendo mais fingir que a corrupção nunca existiu, Lula também não tem conseguido se defender com um mínimo de respostas plausíveis. Como seria possível, na verdade, explicar o que não tem explicação? Ele tenta passar adiante, basicamente, a história de que foi “absolvido” pelo Supremo. Não dá certo. Em primeiro lugar, dizer que esse STF que está aí ficou a seu favor não é recomendação de boa conduta para ninguém – ao contrário. Além disso, é mentira que tenha sido “absolvido” na justiça, pois não recebeu absolvição nenhuma. O STF decidiu de repente que todas as suas condenações não valiam mais, só isso; não falou uma sílaba sobre suas culpas, ou sobre provas, ou sobre nada. Lula diz também que foi “absolvido na ONU” – o que é um disparate cômico, quando se leva em conta que a ONU não é uma vara de justiça, e não absolve e nem condena ninguém. No resto do tempo, limita-se a fazer uns esforços moles, confusos, que não convencem ninguém, para acusar o seu adversário – “rachadinhas”, compras de imóveis em “moeda corrente” e outras bobagens. Tem sido uma resposta ruim. O mundo ideal de Lula é o da “entrevista” que deu à Rede Globo, onde o apresentador já abriu os trabalhos dizendo que ele “não deve nada à justiça” – um insulto rasteiro aos fatos, já que, não tendo sido absolvido de nada, é devedor de tudo. Mas esse ambiente não se reproduziu mais ao longo da campanha. Para desgosto de Lula, corrupção é um assunto que vai estar aí até o fim.