Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça somam mais de 100 anos de condenações e fugiram da penitenciária federal
Primeiros presos a fugir de uma penitenciária federal de segurança máxima no Brasil, Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça ascenderam no mundo do crime organizado atuando no Acre como “matadores” do Comando Vermelho (CV), facção criminosa que surgiu no Rio de Janeiro e hoje é considerada dominante na região Norte. Agora, de acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, que cerca de 300 policiais trabalham nas buscas pelos fugitivos.
Com condenações que somam mais de 100 anos, os criminosos foram transferidos para Mossoró, no interior do Rio Grande do Norte, no fim de setembro do ano passado. A decisão se deu após a dupla participar de uma rebelião que resultou em quatro mortes em um presídio de Rio Branco.
Quatro meses depois, eles protagonizam a primeira fuga de uma unidade da rede penitenciária federal, onde também estão líderes de facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC). São cinco presídios do tipo no País: além de Mossoró, há unidades em Catanduvas (PR), Campo Grande, Porto Velho e Brasília. A primeira delas, no Paraná, foi inaugurada em 2006.
“São presos de altíssima periculosidade, integrantes do Comando Vermelho e todos os dois com extensa ficha criminal por crimes violentos”, disse ao Estadão o promotor de Justiça Bernardo Albano, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC).
Segundo ele, ambos já foram condenados por execuções e homicídios, em processos que correm em segredo de Justiça. Um deles já está há mais de uma década no Comando Vermelho. “Eles são, de certa forma, de um escalão intermediário. Não são da cúpula, mas são lideranças dentro da organização criminosa”, disse Albano.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou nesta quinta-feira, 15, que cerca de 300 policiais trabalham nas buscas pelos fugitivos, entre agentes da Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e das polícias locais. Estão sendo usados desde drones a helicópteros na tentativa de encontrar os dois criminosos. Até o momento, porém, nenhum deles foi recapturado.
Os policiais trabalham com a hipótese de que os foragidos estejam num perímetro de 15 quilômetros ao redor da penitenciária. Câmeras externas não registraram a chegada de veículos para resgatar os prisioneiros e também não foram identificados furtos ou roubos de veículos na região, o que reforça a hipótese de que Mendonça e Nascimento fugiram a pé.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, relatou que nas proximidades da penitenciária uma casa foi invadida e houve furto de roupas e comidas. O que, segundo ele, indica que o ato pode estar relacionado a uma tentativa de sobrevivência dos foragidos.
Quem são os fugitivos da prisão de Mossoró?
- Conhecido como “Deisinho” ou “Tatu”, Deibson Cabral Nascimento, de 33 anos, é considerado um criminoso da “primeira leva” de batismos (quando um criminoso é aceito como membro da facção) do Comando Vermelho no Acre, no fim de 2013. Ele soma penas de mais de 60 anos, com acusações que se acumulam desde a adolescência.
- Já Rogério da Silva Mendonça, apelidado de “Cabeça de Martelo” ou “Querubin”, entrou posteriormente na facção criminosa, em processo de expansão do crime organizado pela região Norte. Conforme o Ministério Público do Estado do Acre, as investigações ainda não conseguiram precisar quando ele ingressou no CV, mas o criminoso passou a ter papel importante dentro da prisão. Suas penas somam mais de 70 anos.
“A investigação relacionada às execuções em si está em segredo de Justiça, mas, do ponto de vista da rebelião, de forma inconteste, eles participaram diretamente”, afirmou o promotor. “Ambos estiveram presentes na primeira ação, que foi o movimento de rendição do policial penal”.
A transferência da dupla para Mossoró foi feita a pedido do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Acre, chefiado por Albano. Além de Deibson e Rogério, 12 presos foram remanejados nas mesmas circunstâncias, todos ligados ao Comando Vermelho.
Conforme autoridades, a facção criminosa do Rio hoje é a principal força do crime organizado não só no Acre, onde rivaliza com o Bonde dos 13 e com o PCC, como em toda a região Norte. Como mostrou o Estadão, a atuação de facções na região têm se intensificado ao longo dos últimos anos, em atuação que se mistura inclusive com o avanço de crimes ambientais.
“O tráfico de drogas é o carro-chefe que trouxe as organizações criminosas para o Estado do Acre. Agora, a organização criminosa em si pratica toda essa plêiade de crimes, como roubos, extorsões, as próprias execuções e disputas de território”, disse o promotor.
Segundo ele, assim que o Ministério Público tomou conhecimento da fuga dos presos, ainda no começo da manhã de quarta-feira, 14, passou a colaborar com o Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) e com a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco, grupo composto pela PF e outros órgãos de segurança) para passar informações relacionadas ao perfil dos fugitivos.
“Todos os dois têm na ficha criminal a prática de crimes de violência, como execuções, homicídios etc. Não posso falar que trata-se de uma missão única (dentro da organização), mas eles têm um perfil de prática de crimes violentos”, disse Albano. O promotor afirma ser prematuro afirmar que os fugitivos irão tentar voltar para o Acre. “É melhor deixar a investigação se encaminhar”.
Após a fuga, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, afastou a direção da Penitenciária Federal de Mossoró e escolheu um interventor para dirigir a unidade. O agente escolhido viajou para o local junto com o secretário Nacional de Políticas Penais, André Garcia. A pasta disse não ter divulgado o nome do policial por questões de segurança.
Já nesta quinta-feira o ministério aumentou o nível de segurança das penitenciárias federais. A medida proíbe banhos de sol e visitas de familiares e advogados até sexta-feira, 16. De acordo com a portaria do MJSP, também estão suspensas atividades educacionais, religiosas e laborais. A única exceção da portaria é para os atendimentos emergenciais de saúde realizados nas unidades. A medida também determina limitação de acesso a áreas comuns.
O Rio Grande do Norte não registra fugas em suas unidades prisionais desde 2021, segundo dados oficiais. Alguns anos antes, em 2017, o Estado assistiu a uma rebelião generalizada na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, na Grande Natal, em ofensiva que deixou ao menos 26 presos mortos.
Já no começo do ano passado o Estado registrou uma onda de violência coordenada pelo Sindicato do Crime, facção que rivaliza com o PCC na região, em cerca de 20 cidades, incluindo Natal. Os casos consistiram em ataques a ônibus, incêndios de estruturas de prefeituras e do governo, além de tiros desferidos contra bases policiais e sedes do Judiciário.